terça-feira, 26 de outubro de 2010
Gato preto
Este micro conto é do autor Thiago Garcez Moreno (por enquanto não farei nenhuma introdução pois estou sem internet, mas em breve voltarei a minha rotina de trabalho).
Todas as noites o mesmo gato preto entra em uma casa abandonada. Ele faz isso há tanto tempo que já nem se lembra mais da época em que era filhote.
Ele perambulava por todos os cômodos até entrar no quarto que pertencia a filha mais nova do casal. Habitava aquele lugar há tanto tempo. O gato sempre vai até a janela e se deita no parapeito observando a lua. Uma mão branca e gorducha acaricia seu pêlo. O bichano se espreguiça banhado pela luz lunar; a mão fica pálida como pérola. A dona, uma garotinha, sorri; ela sempre gostou do gato preto.
Os dois ficam juntos por toda a noite. Quando está quase amanhecendo, o gato desce e corre para fora da casa, desaparecendo na noite como fumaça. O dia amanhece.
Em um dia nada especial, um casal invade a casa e acha uma boneca. O namorado acha divertido colocar fogo nela.
Anoitece. O gato preto, como em todas as noites, vai visitar a garota. Ele não a encontra. Amanhece o dia e o gato desaparece como poeira sendo soprado pela brisa matutina.
domingo, 17 de outubro de 2010
Ao título de 2010
Pela primeira vez falando de futebol aqui e da paixão que é ser tricolor. Levar este escudo no peito e defender estas cores não é tarefa para qualquer um. Não se vira tricolor da noite para o dia, se nasce tricolor, mesmo que não se saiba. Então, para justificar esta paixão desenfreada, um paradoxo racional cai muito bem como incentivo à conquista do título brasileiro de 2010, na forma de uma releitura do conhecidíssimo poema "Mãos dadas", do genial Drummond.
Avante!
Ao título de 2010
Não serei o poeta de um clube caduco.
Também não cantarei as conquistas passadas.
Estou preso à batalha e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei tricolor de um torneio, de um amistoso,
Não cantarei gritos coreografados, advindos da internet,
Não me honrarei dos primórdios e feitos que não vivi,
Não fugirei para um limbo eterno distante do momento presente.
O Fluminense é a minha matéria, o Fluminense presente, os guerreiros presentes,
As conquistas presentes.
sábado, 16 de outubro de 2010
Há ninguém? 3
E segue mais uma parte do conto "Há ninguém?", a terceira, e não é uma trilogia. Aqui ocorre uma súbita mudança na narrativa feita pelo personagem central, porque ele não mais se encontra sozinho. Isso toca profundamente no comportamento humano, na noção espacial dos limites do EU. Com a presença de outra pessoa isso tende a mudar.
Algo que esqueci de mencionar nas partes anteriores foi a desconstrução da narração do personagem por suas ações. É uma grande influência do Mestre Machado, porém me soa, até hoje, original. Muito obrigado aos que passam por estas páginas.
Há ninguém? 3
Ela estava assustada à dias. Todas as pessoas que ela conhecia, e não conhecia, haviam sumido. Consolei-a. Disse que era assim mesmo. As pessoas somem de uma hora para outra. Teve um cara que largou a família para viver com uma mulher endinheirada. Nunca mais viu as filhas. Ela chorou nos meus braços.
Afaguei os cabelos dela. Perguntei que idade tinha. Marcela havia tido sua festa de 15 anos há pouco tempo. Sinceramente esperei não me tornar um defunto autor muito em breve. Cantei Morenita de 15 años. Ela não entendeu. Então lhe ofereci uma carona. Perguntando-me para onde, tornei isto um passeio. Fomos até Silver Devil.
Parei no shopping center, deixei ela no carro, fui às carreiras à loja de conveniências. Sabia que estava lá. Catei vários e vários CDs. Encontrei. Voltei correndo para o carro. Pus Luis Miguel no som e fomos em alta velocidade até o mar.
Sempre que estávamos em linha reta, olhava o rosto dela e apreciava o quanto estava se divertindo com minhas manobras. Parecia prestar atenção aos lugares que passávamos. Olhava para trás. Sorria. Descendo ladeiras, dizia-me experienciar um frio na barriga. Falei que era o coração da máquina, a maneira como Silver Devil se comunicava conosco.
Levei-a até algumas pedras que são constantemente banhadas pelo mar. Era bom ver o rosto dela tão contente. Nunca havia estado naquela praia. Não conhecia paisagem tão bela. Adorou ver o choque das ondas nas pedras. Disse-me que era como música na poesia. Perguntei-lhe se não seria o inverso. Ela afirmou que não. Havia visto na TV uma vez.
Descemos e almoçamos. Marcela estava faminta. Alimentara-se apenas de biscoitos, pão, leite em pó. Não sabia cozinhar. Tinha medo de ir para fora de casa. Disse a ela que o mundo era nossa casa agora. Não devíamos prestar contas a ninguém, poderíamos fazer o que quiséssemos. Viver de festas, compras, viagens, passeios. Prometi a ela uma viagem de iate. Aprenderia tudo sobre em livros e a levaria.
Deixei que ela escolhesse o restaurante. Sua opção fora frutos do mar. Pelo tempo sem ninguém naquele lugar as coisas começavam a estragar. Porém conseguimos selecionar boas peças. E como Marcela gostou muito daquele restaurante, coloquei os melhores frutos no frigorífico, com o máximo de gelo que pude encontrar.
Almoçamos salmão grelhado, risoto, salada de maionese, lagosta e lula. Tentamos beber o vinho branco mais caro da carta da casa, mas era horrível. Derramei na areia e bebemos um Casillero del Diabo mesmo, branco. Ela achou os dois uma bela porcaria. Ri disso, embora tenha sido maldade da minha parte. Enquanto colocava um Paco de Lucia para ouvirmos, ela jogou fora sua parte e abriu um refrigerante.
Voltamos para as pedras e ela me perguntou se isso tudo não seria coisa do diabo. Perguntei por que e ela me apontou a garrafa que eu carregara. Disse a ela que agora não havia mais diabos, deus, deuses, anjos, nem nada mais. Apenas nós, os animais e muita curtição pela frente. E se, ainda assim, um deus insistisse em existir, era ele quem havia retirado todas essas pessoas do nosso mundo para nossa honra e glória. Amém. Ela riu. E como era bonito esse sorriso.
Quando o vento começou a soprar mais forte, descemos as pedras. Precisávamos arrumar logo um lugar para dormir. É muito perigoso dormir dentro de um carro no Rio de Janeiro. Ela adorava minhas tiradas mas me confessou que tinha mesmo medo de dormir naquela região. Preferia dormir onde conhecia bem. Acreditei que tivesse desenvolvido uma fobia por conta dessa situação que apenas para mim não era bizarra. Ela quis saber onde eu dormia. Contei tudo até aquele exato momento. Ela, pelo contrário, não tinha muito que contar, exceto antes de as pessoas darem no pé.
Lembro de ter dito que me mudaria para a igreja. Ela achou uma blasfêmia a princípio, mas concordou que era uma boa idéia depois. No dia seguinte escolheríamos meus móveis e tudo estaria resolvido. Eu teria uma casa, como todo mundo. Levei-a de volta para o apartamento onde morava. Disse para ela fechar bem a porta, apesar de não precisar. E também de não fazer barulho algum na noite escura. E se ouvisse qualquer coisa estranha, que ficasse bem quieta. Assim enganaria qualquer um que se achasse sozinho no mundo. Como acabei amedrontando-a, pediu-me que ficasse. Fiquei, bebi demais e dormi no sofá abraçado... a um porto que peguei no restaurante.
Algo que esqueci de mencionar nas partes anteriores foi a desconstrução da narração do personagem por suas ações. É uma grande influência do Mestre Machado, porém me soa, até hoje, original. Muito obrigado aos que passam por estas páginas.
Há ninguém? 3
Ela estava assustada à dias. Todas as pessoas que ela conhecia, e não conhecia, haviam sumido. Consolei-a. Disse que era assim mesmo. As pessoas somem de uma hora para outra. Teve um cara que largou a família para viver com uma mulher endinheirada. Nunca mais viu as filhas. Ela chorou nos meus braços.
Afaguei os cabelos dela. Perguntei que idade tinha. Marcela havia tido sua festa de 15 anos há pouco tempo. Sinceramente esperei não me tornar um defunto autor muito em breve. Cantei Morenita de 15 años. Ela não entendeu. Então lhe ofereci uma carona. Perguntando-me para onde, tornei isto um passeio. Fomos até Silver Devil.
Parei no shopping center, deixei ela no carro, fui às carreiras à loja de conveniências. Sabia que estava lá. Catei vários e vários CDs. Encontrei. Voltei correndo para o carro. Pus Luis Miguel no som e fomos em alta velocidade até o mar.
Sempre que estávamos em linha reta, olhava o rosto dela e apreciava o quanto estava se divertindo com minhas manobras. Parecia prestar atenção aos lugares que passávamos. Olhava para trás. Sorria. Descendo ladeiras, dizia-me experienciar um frio na barriga. Falei que era o coração da máquina, a maneira como Silver Devil se comunicava conosco.
Levei-a até algumas pedras que são constantemente banhadas pelo mar. Era bom ver o rosto dela tão contente. Nunca havia estado naquela praia. Não conhecia paisagem tão bela. Adorou ver o choque das ondas nas pedras. Disse-me que era como música na poesia. Perguntei-lhe se não seria o inverso. Ela afirmou que não. Havia visto na TV uma vez.
Descemos e almoçamos. Marcela estava faminta. Alimentara-se apenas de biscoitos, pão, leite em pó. Não sabia cozinhar. Tinha medo de ir para fora de casa. Disse a ela que o mundo era nossa casa agora. Não devíamos prestar contas a ninguém, poderíamos fazer o que quiséssemos. Viver de festas, compras, viagens, passeios. Prometi a ela uma viagem de iate. Aprenderia tudo sobre em livros e a levaria.
Deixei que ela escolhesse o restaurante. Sua opção fora frutos do mar. Pelo tempo sem ninguém naquele lugar as coisas começavam a estragar. Porém conseguimos selecionar boas peças. E como Marcela gostou muito daquele restaurante, coloquei os melhores frutos no frigorífico, com o máximo de gelo que pude encontrar.
Almoçamos salmão grelhado, risoto, salada de maionese, lagosta e lula. Tentamos beber o vinho branco mais caro da carta da casa, mas era horrível. Derramei na areia e bebemos um Casillero del Diabo mesmo, branco. Ela achou os dois uma bela porcaria. Ri disso, embora tenha sido maldade da minha parte. Enquanto colocava um Paco de Lucia para ouvirmos, ela jogou fora sua parte e abriu um refrigerante.
Voltamos para as pedras e ela me perguntou se isso tudo não seria coisa do diabo. Perguntei por que e ela me apontou a garrafa que eu carregara. Disse a ela que agora não havia mais diabos, deus, deuses, anjos, nem nada mais. Apenas nós, os animais e muita curtição pela frente. E se, ainda assim, um deus insistisse em existir, era ele quem havia retirado todas essas pessoas do nosso mundo para nossa honra e glória. Amém. Ela riu. E como era bonito esse sorriso.
Quando o vento começou a soprar mais forte, descemos as pedras. Precisávamos arrumar logo um lugar para dormir. É muito perigoso dormir dentro de um carro no Rio de Janeiro. Ela adorava minhas tiradas mas me confessou que tinha mesmo medo de dormir naquela região. Preferia dormir onde conhecia bem. Acreditei que tivesse desenvolvido uma fobia por conta dessa situação que apenas para mim não era bizarra. Ela quis saber onde eu dormia. Contei tudo até aquele exato momento. Ela, pelo contrário, não tinha muito que contar, exceto antes de as pessoas darem no pé.
Lembro de ter dito que me mudaria para a igreja. Ela achou uma blasfêmia a princípio, mas concordou que era uma boa idéia depois. No dia seguinte escolheríamos meus móveis e tudo estaria resolvido. Eu teria uma casa, como todo mundo. Levei-a de volta para o apartamento onde morava. Disse para ela fechar bem a porta, apesar de não precisar. E também de não fazer barulho algum na noite escura. E se ouvisse qualquer coisa estranha, que ficasse bem quieta. Assim enganaria qualquer um que se achasse sozinho no mundo. Como acabei amedrontando-a, pediu-me que ficasse. Fiquei, bebi demais e dormi no sofá abraçado... a um porto que peguei no restaurante.
Leia também as 1ª e 2ª partes deste conto:
sábado, 9 de outubro de 2010
Vigo meo
Este poema surgiu de maneira suplicante. Sutilmente pediu-me para vir ao mundo. Assim eu o trouxe do "estado de dicionário", como Drummond disse uma vez. Ele mescla um pouco da poesia trovadoresca portuguesa com minhas crenças filosófico-religiosas, e é claramente uma alusão ao conhecido poema "Mar de Vigo", uma cantiga de amigo deste período literário. Composto em 4 quadras, montei-o com rimas alternadas. Somente na 3ª quadra rimo apenas as vogais, excluindo as consoantes entre elas. Gosto de dar esse efeito. Parece-me que o poema perde um pouco sua característica "diatônica" e ganha uma característica mais "cromática", como numa escala musical.
Também "forço a barra" na 2ª quadra. O leitor deverá ler "ÓSbens". Assim mesmo, aberto, para poder rimar com "HOmens. Não é muito comum eu fazer isso, mas há momentos em que a construção poética não me deixa outra alternativa. Prefiro não comprometer a mensagem do poema.
Vigo meo
Ondas do mar de Vigo
Ondas do mar bravio
Diz-me se contigo
Vai o vital navio
Donde navegam almas
Daqueles errantes homens
Que no mundo, palma a palma
Valsam por fim os bens
Ondas do mar de Vigo
Ondas do mar Valente
Faz-me tronco rijo
Aos ventos e clemente
Na Lua do céu que no Mar
Resplandece ancestral
E há de me afastar
Dum destino mui banal
Rodrigo Martins
Em algum momento de 2009
E aqui está o original:
Ondas do mar de Vigo
Ondas do mar de Vigo,
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!
Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amigo,
o por que eu sospiro!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amado,
por que hei gran cuidado!
E ai Deus, se verrá cedo!
domingo, 3 de outubro de 2010
Mais um anjo no inferno
É com grande prazer que o Mundo da Penumbra recebe a participação deste talentoso autor multiuso. Ele nos brinda com um conto recém-saído do forno – a lenha, sempre. Com seu peculiar estilo de narração, ele nos descortina um mundo místico, traçando a tênue linha divisória entre o mundo desperto e o mundo dos sonhos míticos.
Portanto, puxem uma cadeira, sentem-se confortavelmente, acompanhem licores e drinques exóticos e degustem com cuidadoso paladar. Convosco, a palavra do autor.
Este conto é uma previa da metade do segundo livro dos quadrinhos “Son of hell”, que estou produzindo com meu amigo e desenhista Cezar Mourão. Estamos empenhados neste trabalho, então, caso gostem, peço desculpas pelo material ainda não estar terminado. Vai demorar um pouco ainda. Este conto fiz para o blog Dascapeta (http://dascapeta.blogspot.com/2010/10/mais-um-anjo-no-inferno.htmls ), e uma das presidentes e editoras disponibilizou o trabalho aqui também, embora o quadrinho seja sério, ele terá essas pitadas de humor. Meu nome é Thiago Garcez e espero que apreciem o conto que terá continuação assim que possível.
Mais um anjo no inferno
Caindo. Sempre caindo. Ao chegar no chão com um baque, ele se machuca ao ouvir um estalo. Ao seu redor ele não enxerga nada.
- Droga! – ele exclama – Isso dói!
Ele se põe de pé e suas asas se abrem como um leque. O homem olha para o pé e vê a unha quebrada do dedão.
- Logo a unha mais preciosa.
O anjo anda rumo ao vazio mancando da perna esquerda. Não há som. Não há nada. Apenas o vazio silencioso que o atormenta. O silêncio que traz pesadelos ao anjo que outrora fora alegre como os pássaros.
- Onde será que o inferno se escondeu? Que inferno!
Como uma visão, os portões aparecem a sua frente e ele cai no chão de rubi que também aparecera debaixo de seus pés.
- Essa cor é tão cheguei para o chão. Se ainda fossem tapetes, mas sangue já não está mais na moda a milênios. Lúcifer nunca teve bom gosto para as coisas, a cafonice sempre esteve vagando por seus corredores.
Surge à frente do homem um demônio bronzeado vestindo malha metálica que o encara ali no chão do inferno.
- Hum...você deve ser um dos guardas – diz o anjo com dificuldade em levantar – Nunca te vi por aqui, mas agora que vi não esqueço mais sua cafonice. – O demônio levanta uma das sobrancelhas – O metal não está mais na moda, é tão rústico, de bárbaro, e não combina com sua pele. Você deveria usar lantejoulas ou paetês dourados, faria um belo contraste a sua pele bronzeada, ia parecer que estava sempre sem blusa, e umas penas iguais as minhas não lhe cairiam mal. – O demônio revira os olhos nas órbitas e o anjo faz cara de náusea.
Apenas com um aceno de dedo o gigante bronzeado o manda seguir.
- Vamos a algum lugar querido? – pergunta o anjo ainda mancando, tentando o acompanhar – Ande um pouco mais devagar. Senão eu não posso sentir o seu cheiro de enxofre, que a propósito, diga-se de passagem, não é o dos melhores aromas que se pode esperar de um guarda dos portões do inferno. Você é como um porteiro. Não pode espantar os visitantes com seu cheiro. Experimente lavanda, ou mesmo o cravo, está na moda nos dias atuais. Esse seu chei... – O demônio se vira para trás e o segura pela gola da parte da frente da blusa e o atira contra a parede.
O anjo atravessa a parede escura e o demônio continua seu caminho resmungando.
O anjo cai de costas no chão no meio do escuro.
- Brutamontes estúpido! – Ele resmunga, enquanto massageia as asas sentado no chão olhando ao redor – Fazendo isso com um anjo da minha classe...
- Qualé a tua frutinha? – Uma voz ranhosa indaga do canto. E o anjo olha para a direção com uma das sobrancelhas levantadas.
- O anjinho tá dodói, é? – Uma segunda voz (uma voz grossa) fala do outro lado – Vamos dar uma lição em você e você vai ter motivos para ter a voz tão mole.
O anjo sorri soltando as asas e cruzando as pernas.
- Ih, olha o cara. – A voz ranhosa diz: – Tá fazendo pose, tá gostando, tá achando que vamos realizar os seus sonhos?
- Ele vai chorar e nem vai saber o que o estraçalhou depois. – A segunda voz ri, um pouco mais próximo.
O anjo sorri novamente e coça o nariz com seu jeito afeminado.
- Será que nunca disseram que preto é uma cor muito sombria e morta? Vocês se escondem demais nela, devem aparecer mais para o mundo.
- Ih, vai a merda...
- Vou ajudar vocês. – O anjo abre as asas e uma luz branca ilumina o lugar – Agora esta bem melhor.
Os donos das vozes recuam para o canto em um salão redondo, enquanto o anjo no meio sorri olhando de um lado para o outro: Duas criaturas minúsculas, medindo não mais de 30 centímetros cada um, ambos da cor rosa.
- Eu adoro rosa. – diz o anjo esfregando as mãos com um sorriso malicioso.
Uma porta se abre na frente do anjo.
- Venha logo. – Diz uma voz conhecida, a voz de Lúcifer. – Venha antes que me arrume confusão.
O anjo se levanta e caminha lentamente, mancando com um ar triste.
- Que pena. – Diz ele olhando para as criaturas que ainda se escondem cada um em seu canto.
- Peço perdão. – Diz Lúcifer olhando-lhe com um ligeiro ar zombeteiro – O guarda é muito rabugento e estressado, mas ele já foi punido pelo que fez.
- Ah, não tem problema. Sempre gosto de fazer novas amizades. – Lúcifer lhe olha com desdém.
- O que você tem a falar? Há muito tempo que não vem aqui. Seja breve, tenho os meus afazeres.
O anjo sorri para ele.
- Você sempre usando essas roupas antigas. Eu adoro, você nunca sai de moda.
Continua...
Portanto, puxem uma cadeira, sentem-se confortavelmente, acompanhem licores e drinques exóticos e degustem com cuidadoso paladar. Convosco, a palavra do autor.
Este conto é uma previa da metade do segundo livro dos quadrinhos “Son of hell”, que estou produzindo com meu amigo e desenhista Cezar Mourão. Estamos empenhados neste trabalho, então, caso gostem, peço desculpas pelo material ainda não estar terminado. Vai demorar um pouco ainda. Este conto fiz para o blog Dascapeta (http://dascapeta.blogspot.com/2010/10/mais-um-anjo-no-inferno.htmls ), e uma das presidentes e editoras disponibilizou o trabalho aqui também, embora o quadrinho seja sério, ele terá essas pitadas de humor. Meu nome é Thiago Garcez e espero que apreciem o conto que terá continuação assim que possível.
Mais um anjo no inferno
Caindo. Sempre caindo. Ao chegar no chão com um baque, ele se machuca ao ouvir um estalo. Ao seu redor ele não enxerga nada.
- Droga! – ele exclama – Isso dói!
Ele se põe de pé e suas asas se abrem como um leque. O homem olha para o pé e vê a unha quebrada do dedão.
- Logo a unha mais preciosa.
O anjo anda rumo ao vazio mancando da perna esquerda. Não há som. Não há nada. Apenas o vazio silencioso que o atormenta. O silêncio que traz pesadelos ao anjo que outrora fora alegre como os pássaros.
- Onde será que o inferno se escondeu? Que inferno!
Como uma visão, os portões aparecem a sua frente e ele cai no chão de rubi que também aparecera debaixo de seus pés.
- Essa cor é tão cheguei para o chão. Se ainda fossem tapetes, mas sangue já não está mais na moda a milênios. Lúcifer nunca teve bom gosto para as coisas, a cafonice sempre esteve vagando por seus corredores.
Surge à frente do homem um demônio bronzeado vestindo malha metálica que o encara ali no chão do inferno.
- Hum...você deve ser um dos guardas – diz o anjo com dificuldade em levantar – Nunca te vi por aqui, mas agora que vi não esqueço mais sua cafonice. – O demônio levanta uma das sobrancelhas – O metal não está mais na moda, é tão rústico, de bárbaro, e não combina com sua pele. Você deveria usar lantejoulas ou paetês dourados, faria um belo contraste a sua pele bronzeada, ia parecer que estava sempre sem blusa, e umas penas iguais as minhas não lhe cairiam mal. – O demônio revira os olhos nas órbitas e o anjo faz cara de náusea.
Apenas com um aceno de dedo o gigante bronzeado o manda seguir.
- Vamos a algum lugar querido? – pergunta o anjo ainda mancando, tentando o acompanhar – Ande um pouco mais devagar. Senão eu não posso sentir o seu cheiro de enxofre, que a propósito, diga-se de passagem, não é o dos melhores aromas que se pode esperar de um guarda dos portões do inferno. Você é como um porteiro. Não pode espantar os visitantes com seu cheiro. Experimente lavanda, ou mesmo o cravo, está na moda nos dias atuais. Esse seu chei... – O demônio se vira para trás e o segura pela gola da parte da frente da blusa e o atira contra a parede.
O anjo atravessa a parede escura e o demônio continua seu caminho resmungando.
O anjo cai de costas no chão no meio do escuro.
- Brutamontes estúpido! – Ele resmunga, enquanto massageia as asas sentado no chão olhando ao redor – Fazendo isso com um anjo da minha classe...
- Qualé a tua frutinha? – Uma voz ranhosa indaga do canto. E o anjo olha para a direção com uma das sobrancelhas levantadas.
- O anjinho tá dodói, é? – Uma segunda voz (uma voz grossa) fala do outro lado – Vamos dar uma lição em você e você vai ter motivos para ter a voz tão mole.
O anjo sorri soltando as asas e cruzando as pernas.
- Ih, olha o cara. – A voz ranhosa diz: – Tá fazendo pose, tá gostando, tá achando que vamos realizar os seus sonhos?
- Ele vai chorar e nem vai saber o que o estraçalhou depois. – A segunda voz ri, um pouco mais próximo.
O anjo sorri novamente e coça o nariz com seu jeito afeminado.
- Será que nunca disseram que preto é uma cor muito sombria e morta? Vocês se escondem demais nela, devem aparecer mais para o mundo.
- Ih, vai a merda...
- Vou ajudar vocês. – O anjo abre as asas e uma luz branca ilumina o lugar – Agora esta bem melhor.
Os donos das vozes recuam para o canto em um salão redondo, enquanto o anjo no meio sorri olhando de um lado para o outro: Duas criaturas minúsculas, medindo não mais de 30 centímetros cada um, ambos da cor rosa.
- Eu adoro rosa. – diz o anjo esfregando as mãos com um sorriso malicioso.
Uma porta se abre na frente do anjo.
- Venha logo. – Diz uma voz conhecida, a voz de Lúcifer. – Venha antes que me arrume confusão.
O anjo se levanta e caminha lentamente, mancando com um ar triste.
- Que pena. – Diz ele olhando para as criaturas que ainda se escondem cada um em seu canto.
- Peço perdão. – Diz Lúcifer olhando-lhe com um ligeiro ar zombeteiro – O guarda é muito rabugento e estressado, mas ele já foi punido pelo que fez.
- Ah, não tem problema. Sempre gosto de fazer novas amizades. – Lúcifer lhe olha com desdém.
- O que você tem a falar? Há muito tempo que não vem aqui. Seja breve, tenho os meus afazeres.
O anjo sorri para ele.
- Você sempre usando essas roupas antigas. Eu adoro, você nunca sai de moda.
Continua...
Assinar:
Postagens (Atom)